domingo, 25 de maio de 2014

Dia 31/12 - Dia 6

Havia chegado o último dia do ano, e, com ele, o último dia da nossa jornada. Havia, entre nós, a preocupação de talvez ter que passar esta próxima noite (a noite de réveillon) ainda na Ilhabela, o que seria bem complicado, pois dificilmente encontraríamos uma pousada ou - mais difícil ainda - uma praia deserta para acampar na face continental da Ilha. Então o plano para o dia seria chegar a São Sebastião, o que nos colocava diante de 40 km de água salgada que separavam o Bonete da praia de São Francisco - ou Bairro, para os íntimos. Ainda bem que estávamos descansados.
Acordamos por volta das 6h00 da manhã, tentando fazer o mínimo de barulho possível para não acordar as moradoras da casa, mas não adiantou muito: minha tia Inês levantou-se e começou a ajudar. Recolhemos tudo o que precisaríamos e deixamos grande parte das comidas, havia sobrado bastante. Nos despedimos da tia Silvana (que estava dormindo profundamente e não respondeu) e descemos até a praia para pegar os caiaques que estavam na casa dos amigos das minhas tias. Mais alguns instantes e estávamos na praia, com a companhia matinal apenas do pessoal da prefeitura que faz a limpeza.

 Amanhecendo no Bonete

 A preparação da bagagem, sob a tutela da tia Inês.

Caiaques prontos para zarpar! 

O pessoal da prefeitura limpando a praia, com o morro do Bonete como testemunha.

Nos despedimos da tia Inês na praia e, às 7h40 estávamos de volta ao remo, com todos os quilômetros que nos aguardavam estendidos à nossa frente. Estava uma bela manhã, sol celebrando o último dia de 2013. Remávamos para o oeste, sem vento, maré levemente contra, de sul. Dezenas de barcos cruzavam, levando os turistas pra passar a virada do ano no Bonete, ou indo buscá-los na cidade. Alguns nos reconheciam e acenavam, uns poucos paravam e perguntavam se estava tudo ok conosco. A verdade era que estávamos indo bem demais! O descanso de um dia parado se mostrava muito eficiente, tanto que, de repente, e quase que sem notar, havíamos chegado na foz do Rio do Lajeado, que, alguns metros acima, forma a famosa cachoeira que intercepta a trilha do Bonete. Ficamos nos perguntando "será possível? Já?", e só tivemos certeza após perguntar para um pescador que estava fundeado por ali.

Tchau Bonete! Feliz 2014! 

Saindo do Bonete, mares mansos... 

Parada pra uns bons drinks. 

Vai, Capitão!

Da ponta do Lajeado era possível avistar a Ponta do Sepituba, cerca e 2 km à frente. Miramos nela e remo. O sol começava a se mostrar disposto a querer nos fazer lembrar dele no dia seguinte - mesmo porque nos aproximávamos das 10h00 da manhã. Alguns dos isotônicos que nos sobravam (trouxemos todos) já haviam sido devidamente bebidos. Reforcei o protetor solar fator 50 nas canelas e no rosto.
Ao chegar a ponta do Sepituba, às 10h00 da manhã, depois de seis dias de viagem avistamos novamente o continente e, o melhor de tudo, a costa sul de São Sebastião e suas ilhas. Foi uma visão muito legal, ao menos pra mim.

TERRA À VISTA! 

A sombra do caiaque em um bloco submerso.

Seguimos remando, e observamos as primeiras casas na costeira. Notamos que muitas delas jogam seus esgotos e águas pluviais diretamente no mar, infelizmente. Remamos até avistar o Farol da Ponta da Sela, que marcaria oficialmente nossa reentrada no Canal. Ali, o trânsito de barcos, jet-skis, caiaques e mergulhadores já era bastante intenso. Por sorte, a essa hora algumas nuvens vinham nos aliviar da inclemência do astro-rei. Ao passar a ponta da sela, era possível observar a estrada e alguns carros - depois de seis dias sem respirar a fumaça de nenhum.
Nosso plano era parar na praia do Curral pra almoçar. No entanto, a praia estava completamente lotada, tão lotada que era até perigoso tentar se aproximar de caiaque - poderíamos atropelar, sem querer, uma criança, por exemplo. Decidimos então tentar a próxima praia, no caso, a Praia Grande. Ela também estava cheia, mas havia algum espaço pra encostar na areia. Muito cansados, atracamos e eu fui comprar um sanduíche natural e um guaraná pra cada um, enquanto o Capitão ficou olhando os caiaques.

Mansões à beira-mar. Note a tubulação lançando algum efluente diretamente na pedra, que até já mudou de coloração.

Outra casa, essa mais integrada. 

Farol da Ponta da Sela. Estávamos de volta ao canal! 

Já no canal de São Sebastião. 

Um carro! 

Praia do Curral, lotada. 

Na Praia Grande, nosso momento de descanso.

Após comer e descansar um pouco (cerca de 40 minutos), logo estávamos no mar novamente. Ainda restava cerca de 10 km pra finalizar a volta, mais o retorno para São Sebastião. Passamos pela praia do Julião, e, quando estávamos chegando na Feiticeira, surge, na nossa frente, um pinguim, com bastante jeito de perdido. A pobre ave era meio marrom, e assim que nos viu mergulhou e ressurgiu uns 20 metros adiante. Felizmente consegui fazer uma filmagem de alguns segundos.
Chegando na ponta da praia do Portinho, vislumbramos com mais clareza a Ilha das Cabras. Apontamos e seguimos. Lá chegando, estava acontecendo algum evento, tinha um monte de gente com caiaques dando a volta na Ilha. Esquisito.

 Partindo da Praia Grande, reabastecidos e descansados.

O mar, esse lindo. 

Passando pela ilhota da Praia do Julião. 

Praia do Julião, lotada. É verão! 

À frente, Ilha das Cabras. 

São Sebá ao fundo. Se não me engano, a Praia Preta. 

Olha o pinguim ali. Ok, parece um pato, mas eu juro que era um pinguim mesmo.

Demos continuidade, passamos pela balsa, Perequê, Itaguaçu, Saco da Capela e, finalmente, às 16h55, depois de seis dias remando, 33 horas no mar, quase 70.000 remadas, cinco espinho de pindá sob a pele e algumas histórias na bagagem, chegávamos à pequena praia da Vila, fechando, assim, nossa meta da volta completa à Ilhabela. Foi incrível.

Passando pela balsa!

Escuna de São Luís/MA, fundeada no Saco da Capela.


A VILA!

Missão cumprida! Parabéns, Capitão!

Eu estava muito cansado, e morrendo de fome. Já não tínhamos nem barras de cereal, isotônicos, nada. Meu pai não demostrava tanto cansaço, e acabei atrás de algo pra comer enquanto ele cuidava dos caiaques, e acabei encontrando umas tortas de palmito e frango na lanchonete D'Aqui, que fica ali no centrinho. Ainda teríamos 5 km para remar, afinal, tínhamos que chegar em casa. Comemos e descansamos e, depois de 40 minutos, novamente estávamos no mar, dessa vez, pela última vez no ano.
E aí, o que era pra ser uma volta pra casa tranquila, foi, na verdade, talvez o pior trecho da travessia. O vento estava vindo de nordeste, e a água, entrando de leste no canal. O vento fazia vagas de 1,0, 1,5 m que se chocavam contra a bochecha de boreste, com tal violência que, depois de uma centena de quilômetros navegados, finalmente eu tive meu primeiro tombamento, no meio do canal de São Sebastião. As ondas dificultaram um pouco, mas em segundos eu estava novamente a bordo, seguindo para casa.
Voltando pra casa, no canal indomável.

A nossa dúvida era onde, exatamente, atracar em São Sebastião. A princípio iríamos até o Bairro, ponto de partida, mas, devido ao vento, cada km economizado seria uma dádiva. O ponto mais próximo seria a Praia Deserta ou no Pontal, perto do píer, mas vimos que seria possível remar um pouco mais e ir até a Praia do Arrastão. Do meio do canal meu pai pegou o celular que tinha levado e conseguiu falar com a Néia, que combinou de aguardar-nos lá na praia.

 "Não, não estou interessado em um novo plano..."

Continuamos a remada, passando ainda com um cara de kitesurf, aproveitando as rajadas poderosas. A verdade é que, apesar do vento contra, das ondas que faziam nossa proa saltar e, principalmente, do cansaço, estava um belo final de dia, com o sol se pondo atrás dos morros de São Sebá. Com esse visual, conseguimos distinguir, pela primeira vez, os contornos da praia do Arrastão, para a qual seguimos em linha reta desde o meio do canal. Quando estávamos a uns 200 m da praia, conseguimos distinguir algumas fisionomias conhecidas na praia: a Néia, o Rodrigo (meu primo), a Ziza (irmã da Néia) com o Paulinho (marido), o Cadu (outro primo), meus tios Laudir e Silvinha com minha priminha Elisa, o Rocha e o Gésio, também irmãos da Néia. O Rodrigo estava tirando algumas fotos, que, infelizmente, mais tarde ele descobriu que foram perdidas, e, assim, como nossas câmeras já estavam sem bateria, não temos imagens da chegada... Mas tinha até champanhe!! Estouramos e recebemos os abraços dos parentes, nos parabenizando pelo feito. Nos abraçamos também, prometendo que aquela não seria a última aventura do tipo.

Nos aproximando! 

 Com o último sol do último dia do ano.

Essa é a última foto que temos, antes de acabar a bateria da máquina.

E voltamos pra casa, pra festejar o último dia do ano e a chegada de 2014, que prometia muitas alegrias.

Neste último dia remamos 38,7 km, o recorde absoluta da viagem, das 7h40 da manhã até às 19h05 da noite, quando chegamos ao arrastão. Descontando as paradas, foram pouco mais de 10 horas, com velocidade média de 3,7 km/h. Na travessia do canal fizemos com velocidade de 3,1 km/h. Somando a quilometragem desse dia, percorremos o total de 117,35 km em cinco dias.


Um comentário:

  1. UFA! Confesso que, mesmo sabendo que os aventureiros chegaram bem, fui prendendo a respiração enquanto lia as postagens... A minha ansiedade foi indo num crescente, como se eu estivesse lá na praia esperando os caiaques! Tirando por mim, imagino a ansiedade dos navegadores... Que coragem vcs tiveram! Estão de parabéns por tudo: pelo resgate e retomada de um sonho, pelo "start", pelo planejamento, pela perfeita sincronia e pela parceria harmoniosa durante toda a jornada! Agora vamos respirar aliviados e nos preparar pra próxima aventura! Haja coração e oração!

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